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Cinemateca Revolucionária #14: À Procura do Socialismo (1994)

Maio 27, 2013

À Procura do Socialismo (1994)

O longo, e decisivo, caminho que os trabalhadores de todo mundo percorrem para se libertarem dos grilhões do capital criminoso e alcançarem o reino da liberdade é feito de lutas constantes, umas vitoriosas outras nem tanto, de revoluções e traições, que têm apenas um único, e final, objetivo: «À Procura do Socialismo». Os trabalhadores, e as demais classes oprimidas e exploradas, vivem continuamente num estado de necessidade, precariedade e de guerra porque estão submetidos a um poder que, muito longe de os representar, os oprime e explora. Este cenário, incontestável e visível diariamente, é resumido numa, simples e inteligente, pergunta feita por um jornalista em resposta à expressão infeliz de um trabalhador que diz querer uma democracia às direitas.

«Uma democracia às direitas ou uma democracia às esquerdas?»

Isto remete-nos às primeiras reflexões, sobre como libertar os trabalhadores e a sociedade, feitas pelos primeiros socialistas, chamados utópicos, como Charles Fourier, Saint-Simon e Proudhon onde Antero de Quental foi beber a inspiração. A ideia do socialismo há muito que atormenta o pensamento dos lutadores sociais conscientes de que o capitalismo «já deu o que tinha a dar», porém ninguém sabia ao certo como proceder para criar a nova sociedade. Felizmente havia uma ideia consensual: só os trabalhadores poderiam construí-la; a obra de Karl Marx e a experiência de governo operário, durante a Comuna de Paris, vieram comprová-lo.

Formaram-se então dezenas de partidos socialistas e democráticos, a chamada social-democracia, e constituíram-se os primeiros sindicatos de trabalhadores – isto porque já haviam sindicatos, mas de patrões. Em 1890, comemora-se, pela 1ª vez o Dia Internacional do Trabalhador; em 1914, é criada, na cidade de Tomar, a primeira central sindical portuguesa: a União Operária Nacional; e em 1917, o Partido Operário Social-Democrata Russo (bolchevique) realiza a primeira revolução operária da História. A marcha gloriosa da história levou os trabalhadores ao poder e com a vitória na Rússia, ninguém podia questionar a força da classe trabalhadora quando esta está unida, organizada e dirigida por um partido revolucionário. Esta vitória serviu de aviso para a burguesia, possuidora e capitalista, que rapidamente entendeu que teria de esmagar e destruir todas as formas de organização operárias, pois elas representavam uma força inimiga, um entrave aos seus planos de dominação mundial (imperialista) e um perigo real à sua existência como classe. O resultado prático desta reação histérica da classe dominante foi o reforço do chamado capitalismo de estado, que atingiu o seu expoente máximo sob os regimes fascistas, tudo para combater o avanço da classe trabalhadora vitoriosa, inspirada pela Revolução Operária na Rússia. A História deu um nome a este período contra-revolucionário: 2ª Guerra Mundial.

«Uma divisão mundial de trabalho feita pela burguesia é feita do seguinte modo: tu trabalhas, eu não. Só os trabalhadores poderão proceder a uma divisão justa do trabalho.»

Dito e feito. A burguesia fez a sua divisão, matou milhões de trabalhadores e travou o avanço da revolução socialista mundial. Do estado operário revolucionário russo, que estagnou com a derrota do movimento operário internacional, só sobreviveu o  seu aparato burocrático controlado pela nova aristocracia comunista (estalinista).

No entanto, apesar do triunfo do capitalismo, a energia e a resiliência da classe trabalhadora é inesgotável. A classe trabalhadora, intimamente ligada ao desenvolvimento da economia capitalista, está sempre em movimento e quando se mexe consegue transformar toda a sociedade, muito mais do que qualquer grande investimento ou guerra imperialista. Se nada acontece atualmente é simplesmente porque a sua direção a mantém dentro do legalismo burguês. O pacifismo, o compromisso e a responsabilidade social, sob um regime capitalista, só favorecem o patrão e nada mais que o patrão. As direções paternalistas, que olham do alto dos seus palanques para a classe trabalhadora, devem ser questionadas da mesma maneira que questionamos incessantemente o governo, pois muitos dos sindicatos atuais tornaram-se correias de transmissão do patronato e do poder financeiro. Mas?… A resposta é: Nem Deus, nem Senhores. Daí os trabalhadores portugueses terem escolhido seguir, durante muito tempo, líderes anarco-sindicalistas que se mostravam mais ousados e combativos que os seus congéneres socialistas. Todavia a ousadia anarquista, descentralizada, sempre que embatia contra o poder centralizado do estado, era facilmente esmagada; por isso há que considerar positiva a evolução para centrais sindicais de índole socialista que reforçaram a solidariedade e o poder reivindicativo da classe em geral. Falta, contudo, uma direção verdadeiramente socialista e revolucionária e foi o que faltou em 1974.

Eis que neste pequeno país estala uma revolução, operária e popular, deitando por terra todos os sonhos dos capitalistas portugueses. A história é simplesmente contundente: o Trabalhador e o Burguês são inimigos mortais; o 25 de Abril, e o seu processo revolucionário (PREC), são dos exemplos mais notáveis dessa luta mortal de classes e de como o ascenso do povo trabalhador nos leva inevitavelmente ao Socialismo. Padres, intelectuais, lojistas, democratas foram todos obrigados a conformar-se com isso. Ora vejamos o que diziam os atuais partidos parlamentares durante o PREC:

Francisco Sá Carneiro (PSD): Para nós socialismo é o caminho da libertação plena do homem. Valorização integral da pessoa, libertação de toda a alienação, exploração e opressão.

Francisco Salgado Zenha (PS): A proposta que o partido socialista faz, a proposta do socialismo em liberdade, é a única que, a nosso entender, pode constituir uma solução de esquerda para os problemas do povo português.

Álvaro Cunhal (PCP): É uma exigência, primeira e prévia, para a possibilidade de ser formado um governo voltado, efetivamente, para a construção do socialismo; que os trabalhadores sintam essa perspetiva e comecem a intervir, não apenas na vida política mas na vida social e na vida económica de maneira a possibilitar essa perspetiva de um governo revolucionário. Enfim, voltado e determinado a assegurar a construção do socialismo no nosso país.

Freitas do Amaral (CDS-PP): Por nossa parte consideramos muito importante, e imprescindível, o contributo que a ação dos partidos socialistas exerceram no último meio século para a humanização das condições de vida dos trabalhadores. Mas segundo a nossa conceção de vida, todos os homens são iguais e profundamente solidários. Também nós, por isso, desejamos sinceramente atingir um dia o ideal da sociedade sem classes.

Reparem no teor idealista do comentário do dirigente do PCP. O célebre comunista pede aos trabalhadores para, numa sociedade burguesa, começarem a construir o socialismo, como se bastasse a boa vontade e a democracia para construir uma nova ordem económica – veja-se o processo de implantação do capitalismo na Inglaterra, onde os pequenos proprietários rurais foram expulsos violentamente das suas terras para serem obrigados a trabalharem nas fábricas; como se fosse possível construir alguma coisa enchendo diariamente os bolsos ao patrão, que utilizará o dinheiro para explorar ainda mais o trabalhador. As únicas pessoas que conseguem construir/destruir, nesta sociedade, são aqueles que detêm a posse dos meios de produção, ou seja os capitalistas. O mesmo se aplica à democracia parlamentar atual que, estando subordinada ao poder económico-financeiro, só aprova o que dá jeito ao banqueiro e ao empresário enquanto deixa umas migalhitas para os trabalhadores continuarem vivos. O amor de Álvaro Cunhal à democracia, todo o respeito à sua obra, ficaria bem junto de Antero de Quental e do grupo de socialistas utópicos portugueses.

Mas como vemos hoje, com os seus atos e políticas, era só conversa. O que não é de espantar se analisarmos as classes que os partidos representam. Porque a defesa da propriedade privada, da democracia parlamentar e do estado burguês (tribunais, bancos, escolas, polícia, igrejas, etc.), significa a perpetuação do capitalismo, da exploração, da fome, da miséria e dos FMIs. Não esqueçamos que já é terceira vez que chamam essa organização internacional de ladrões para resolver «crises».

Todavia, estas declarações provam que, perante um ascenso revolucionário de massas, os setores mais reacionários da sociedade, representados pelos seus partidos, podem discursar à esquerda e até apresentar propostas revolucionárias, que neste caso é – pasme-se (!): a construção de uma sociedade sem classes. É caso para dizer que, durante o PREC, a classe dominante estava toda tonta e decerto com a garganta seca de tanta mentira. Portanto não é de espantar, ao olharmos para a situação de crise atual, vermos os marcelos, os paulinhos e os inseguros completamente desorientados com ressurgimento do movimento operário, ainda que tímido, e das movimentações de massas nas ruas, porque eles sabem o que isto significa. Significa que vivemos um pré-PREC; e estes senhores não têm vontade de meter os seus partidos a falar novamente em socialismo e numa sociedade sem classes.

Os trabalhadores portugueses andam perdidos mas no fundo estão todos «À Procura do Socialismo». E este documentário, de 1994, é essencial para todos aqueles que se sentem afetados por esta crise que, segundo a teoria trotskista, é a crise final e fundamental do capitalismo e só será superada pela destruição do estado que a fomenta e a mantém, o estado capitalista burguês.

F. C.
26 de Maio, 2013

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